sábado, 12 de julho de 2008

Os Fuentes - Parte XX (FINAL)

Na manhã seguinte houve um funeral com caixão lacrado. Uma missa foi celebrada e o velório foi realizado com uma quantidade ínfima de participantes. Eram apenas dez pessoas no total, sendo que seis delas tiveram que ser contratadas para carregar o corpo.

– Hoje eu vejo como o Henrique era malquisto. Comentou Juan.
– Ele pisou em muitas pessoas, destruiu muitas vidas. É um final triste para quem semeou tristeza. Respondeu Rosa.
– No entanto, você sempre permaneceu ao lado dele. Ficou até o último instante. Replicou Juan.
– Sim, eu fiquei por amor aos meninos. Prometi à mãe deles que eu cuidaria dos dois. Finalizou Rosa.

O céu estava cinzento e uma fina garoa caía sobre a madeira escura do caixão. Não houve lágrimas, apenas silêncio.

Dez meses se passaram e Cristóban estava recuperado, assim como Ernesto. O caçula nutria uma admiração muito grande pelo irmão mais velho e passou a ouvir seus conselhos: voltou a estudar e agora fazia planos de cursar uma faculdade e construir uma carreira. Ernesto se apaixonou pelo trabalho de seu tio Juan e logo começou a trabalhar com ele. Cristóban tinha muitos problemas para resolver, coisas que seu pai deixou por fazer. Não havia mais fortuna, só o que restara foi a grande casa e dois carros. Rosa continuava ao lado deles como uma mãe dedicada.

Cristóban ficou parado no jardim diante da grande residência. Apenas observava - absorto em seus pensamentos. Seu rosto tinha um ar de aflição, mas seus olhos tinham um que de esperança.

Sofie chegou bem devagar por trás de Cristóban e lhe roubou um beijo. Eles se olharam e sorriram; os dois se abraçaram.

– Pensando em quê, meu amor? Perguntou Sofie.
– Estou pensando em aceitar a proposta do meu tio Juan e transformar essa mansão em uma clínica que pudesse receber pessoas de vários lugares do país. Ele sabe que esse sempre foi o meu sonho, e ele sempre me apoiou.
– Então, porque o ar de preocupação no seu rosto? Indagou Sofie.
– Não sei se eu darei conta de tocar um projeto como esse. E essa casa tem tantas lembranças tristes... Respondeu Cristóban um tanto desanimado.
– Então nós faremos lembranças felizes e encheremos essa casa com a alegria das pessoas que aqui terão atenção e cuidados. Faremos dessa casa um porto seguro para quem procura o alívio de suas dores. Eu estarei ao seu lado em todos os momentos. Disse Sofie com voz suave.

Cristóban fitou Sofie nos olhos, deu um sorriso e a abraçou. Sentiu a sua alma se revigorar com a esperança de que as coisas mudariam. Estava novamente em casa com as pessoas a que tanto amava.

– O seu amor me completa, Sofie. Agora eu sinto de verdade que tudo pode ser diferente.
– E será, Cristóban. Eu tenho certeza que seremos muito felizes.


FIM

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Os Fuentes - Parte XIX

No hospital a ambulância já era esperada por uma equipe médica e uma sala de cirurgia estava pronta para receber Cristóban. A chegada ao hospital foi rápida, mas os paramédicos estavam tendo muita dificuldade para manter os sinais vitais estáveis. A hemorragia era grande e Cristóban teve uma parada a caminho do hospital.

Tumulto, e a maca com Cristóban atravessou a emergência como um foguete. Paramédicos avisando sobre os procedimentos usados, pressão arterial, respiração, pulsação. Dr. Roberto ouvia tudo com muita atenção enquanto corriam para o centro cirúrgico. Cristóban abriu os olhos por um instante – num breve momento de consciência –, sentiu uma dor aguda, viu vultos de rostos ao seu redor, luzes, e novamente desmaiou. Portas se abrindo. Correria. Gritos; e uma equipe médica tentando salvar uma vida.

A operação já chegava há quase seis horas, muitas bolsas de sangue e plasma foram usadas. Cirurgiões se revezavam na mesa para evitar a fadiga e ter o melhor resultado. O esforço de todos era evidente.

Na sala de espera estavam o tio Juan e Sofie. Rosa estava em repouso, sedada. Os acontecimentos daquele dia haviam deixado a governanta muito abalada. Todos estavam aflitos, sem notícias. Sofie chorava em silêncio.

– Fique calma, minha filha. O meu sobrinho é forte e vai sair dessa. Disse Juan à Sofie.
– Não é justo, logo agora que as coisas entre nós dois estavam se acertando. Eu passei tanto tempo sonhando e esperando pelo Cristóban, e agora ele está partindo e eu não posso fazer nada. Falou Sofie entre soluços.
– Acalme-se, moça. Vocês dois ainda terão muitas histórias para viver. O Cristóban não vai entregar os pontos, ele é um lutador! Sentenciou Juan.

Depois de mais de seis horas e meia de cirurgia, Cristóban foi levado para uma sala de pós-operatório e o Dr. Roberto dirigiu-se até a sala de espera para dar notícias:

– A cirurgia foi muito bem! Conseguimos parar a hemorragia, remover o projétil e arrumar a bagunça. Os sinais vitais dele estão estáveis e isso é ótimo! O Cristóban é forte e jovem, acreditamos que ele vá reagir bem. Toda a equipe está otimista.

Juan deu um suspiro aliviado e Sofie abraçou o Dr. Roberto, agradecendo. Imediatamente foram a um quarto de repouso onde estava Rosa. Acordaram a governanta delicadamente e deram a boa notícia. Rosa sentiu que havia tirado um peso enorme de seu peito, mas ainda ficava imaginando como daria a notícia do suicídio do Dr. Henrique aos meninos.

– Uma coisa de cada vez. Hoje celebramos a vida, amanhã pensaremos na morte. Disse a governanta.

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Os Fuentes - Parte XVIII

Poucos minutos após o estrondo, Rosa chegou ofegante até a porta do escritório e a cena que presenciou a fez gelar de pavor. Notou que Cristóban estava caído com a mão sobre o abdome e a sua camisa estava toda manchada de sangue. Tentou gritar, mas a voz não saía. Olhou para o lado e viu Henrique atônito, perdido, com um revólver na mão.

– O que o senhor fez? Perguntou Rosa em um balbuciar meio espremido.

Rosa correu para o telefone e ligou para o serviço de emergência. Em seguida, e ainda tremendo, arrancou um pedaço da cortina e a segurou sobre o ferimento de Cristóban na tentativa de estancar o sangue. Olhava para o Dr. Henrique sem entender direito o que havia acontecido e tudo o que via era um homem confuso, falando sozinho e completamente alterado. Rosa olhou fixamente para ele e perguntou:

– Por que fez isso?
– Isso? O quê? Respondeu Henrique um tanto confuso.
– Não viu o que o senhor fez? Atirou no próprio filho! Gritou Rosa aos prantos.

Henrique olhou para o corpo de Cristóban esticado sobre um tapete e tomou um susto. Olhou para a sua mão e viu que empunhava um revólver. Sentia o forte cheiro de pólvora. Tentou raciocinar, por um instante parecia ter recobrado a lucidez e falou baixinho:

– Meu Deus! Eu matei meu filho...

O desespero tomou conta dele. Percebeu o que havia feito, mas não sabia porque e nem como.

O socorro chegou rapidamente na residência e os paramédicos começaram a realizar as primeiras manobras na tentativa de estabilizar o quadro de Cristóban. Rapidamente ele foi levado para a ambulância enquanto Rosa, ainda perturbada, deixou Henrique sozinho em seu escritório para avisar ao Dr. Roberto sobre a tragédia. Imediatamente o médico da família preparou-se para receber o jovem baleado.

Assim que desligou o telefone, Rosa ouviu um segundo estampido seco vindo do escritório. Correu o quanto pôde – considerando que o seu nervosismo a fazia esbarrar nos móveis e tapetes pelo caminho – caiu uma vez, e outra antes de chegar; assim que atravessou a grande porta viu uma mancha de sangue na parede, uma poça no chão e um corpo estendido. Henrique Fuentes acabara de tirar a própria vida: um disparo, nem mais um suspiro.